A história de Thieres Duarte, que vive no
interior de Minas Gerais, foi contada primeiro por ele, resumidamente, na
página oficial do UOL no Facebook
Ele
aceitou o convite para que os usuários da rede social compartilhassem na
fanpage do UOL casos de bullying que conhecessem ou tivessem sofrido, além
de expressarem sua opinião sobre o problema. Mais de 300 pessoas participaram
do debate.
O
bullying, termo que vem da palavra inglesa "bully", que significa
brigão ou valentão, caracteriza a situação de agressões intencionais e
repetitivas, verbais ou físicas, por uma ou mais pessoas contra um ou mais
colegas. Pode acontecer no ambiente escolar, em casa ou no local de
trabalho.
A
história de Thieres explicita as consequências do bullying, sofrido ainda
na infância, quando a pessoa se torna adulta.
"A partir daí, nunca mais
tive coragem de apresentar um trabalho", lembra ao falar da humilhação
sofrida durante uma apresentação na escola. O mesmo trauma o levaria a
abandonar, anos depois, a faculdade.
Ele
resume a discussão sobre o bullying dando à questão o peso que merece.
Bullying, como sugere, pode levar até ao suicídio. É uma violência grave e de
consequências marcantes. Leia o depoimento de Thieres ao UOL.
"Meu
nome é Thieres Duarte, completo 25 anos no próximo dia 15 de janeiro. Nasci em
João Monlevade [município do interior de Minas Gerais, a 110 km da capital], e
moro em Bela Vista de Minas [município vizinho]. Meu pai e irmão são
operadores de máquina, minha mãe é microempresária. Tenho nível superior
incompleto em administração.
Sofri bullying na escola, na rua
e em casa Pelo meu jeito quieto, tímido, já entendiam que eu era diferente.
Deduziam já cedo que eu era gay, antes mesmo de eu saber. Os colegas de sala
começavam a zoar, chamando de veado, boiola
bichinha. Empurravam a minha
carteira em direção a mim, às vezes me encurralavam em cantos enquanto algum
responsável não via.
Teve momentos em que, quando eu
estava na fila para sair da sala, pisavam no meu tênis machucando o meu pé, eu
por medo ou por algum motivo que não sei explicar me sentia acuado, não reagia,
não falava para ninguém.
No ensino médio, por causa do meu
jeito de ser, as implicâncias comigo continuaram. Na época, fui para outra
cidade estudar, já que na cidade em que morava eu continuaria com a turma de
infância. Achei que ia mudar, mas foi a mas foi a mesma coisa: recebia os
insultos, apelidos e foi a fase que mais me deixou marcas.
De um dia me recordo muito bem.
Quando fui apresentar um trabalho de química, na minha vez de falar, uma
turminha no fundo começou a fazer gestos insinuando que eu era gay.
Com 17
anos eu não era assumido, estava tomado de incertezas sobre quem eu
era. Naquele momento ver aquele pessoal me expor, a turma rindo e o
professor nem aí, como se aquilo fosse normal e fizesse parte da aula, me
traumatizou.
Um jogou
bolinhas de papel em minha direção, eu continuei a apresentar com o coração
acelerado, me sentindo horrível por dentro, mas continuei porque era o último
do ano e precisava de ponto. A partir daí, nunca mais tive coragem de
apresentar um trabalho.
'Preferia um filho morto a um
filho gay' Ser gay me fez sofrer durante anos. Também sofri
muito bullying em casa por parte de mãe, tias, irmão. Minha família nunca
aceitou e, quando assumi em casa, aos 21 anos, ouvi absurdos
como 'preferia um filho morto a um filho gay', que eu era 'doente', que eu
'não valia nada', era 'um zero à esquerda'. Isso tudo me fez pensar em me
suicidar.
Meu pai é
muito calado, apenas disse que não queria problemas perto dele, ou seja, para
não trazer ninguém que eu namorasse. Em outubro passado, ele entrou em
depressão profunda, tentou se matar de formas horríveis, eu e minha
mãe que salvamos. Alguns da família disseram que, entre os vários motivos
da depressão, um era eu ser gay.
'Bullying é sério, deixa marcas e
mata' Não é frescura, somente quem passa sabe o que é. É como depressão: muita
gente ainda pensa que é frescura, mas é um caso sério, deixa marcas e mata. O
bullying mexe com a alma de quem sofre o ataque, é bem lá no íntimo de
cada um.
Gostaria que as pessoas que dizem
que é mimimi se colocassem no lugar de quem sofreu algum ataque, se
imaginassem naquela situação sem o apoio de ninguém, calado, ouvindo os
insultos. Será que se sentiriam bem?
As consequências em minha vida
foram sérias. Me tornei um cara extremamente envergonhado, tímido e inseguro.
Fiz teatro por quatro anos para tirar essa timidez, me libertei muito, mas
acabou voltando. Quando entrei na faculdade de administração, já entrei
imaginando como seria o primeiro trabalho, meu coração já acelerava meses
antes.
Quando chegou o dia, tudo
decorado, pronto, na minha vez de falar eu olhei para a turma e me lembrei do
ensino médio. Comecei a tremer, a mão não parava quieta, a voz não saiu, eu já
imaginei que eles estavam me julgando em pensamento e não saiu nada. Eu
fiquei parado, o próximo a apresentar do meu grupo falou a minha parte, eu saí
duro da sala e comecei a chorar, tranquei a faculdade e até hoje tento voltar.
Eu sei que tenho de lutar contra
isso, mas é uma força dentro de mim que me faz voltar lá no passado e relembrar
tudo. Talvez precise de um psicólogo, em que ainda não fui. Esse medo de ser
julgado e humilhado foi a marca horrível.
Me tornei um cara extremamente
envergonhado, tímido e inseguro.
Apesar de tudo, tenho um livro
publicado, 'As Aventuras de Superzil' [Chiado Editora]. É um super-herói
que eu queria ser desde criança e há dois anos resolvi publicar. Acho que
para realizar esse sonho e dar vida a esse herói que eu queria ser.
É um humano resolvendo os problemas. Sou bom em textos, sou um cara
bacana, cheio de ideias criativas, mas que não consigo executar com esse medo
que me bloqueia.
Alguns traumas consegui superar,
sim, mas não consegui superar ainda o medo de expor minhas ideias, falar em
público, sempre tenho medo de sofrer ataques de novo. Mas sou feliz com o que
sou, me aceito, não tenho ódio nem guardo rancor do que passei, apenas
gostaria que fosse tudo diferente .
Retirado do link :
Nenhum comentário:
Postar um comentário