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envolve superação ,experiências pessoais e bullying
Dona Gemma, paixão por ensinar
Escrito
por Gabriel De Lucca
Numa
tarde fria de maio de 2008 estava
indo encontrar meu personagem na rua Paris, que é localizada no bairro do Sumarezinho. Chegando lá, parei o
carro e a observei conversando com as vizinhas na frente do portão de sua casa
sobre coisas triviais do cotidiano. À sua direita, a vizinha de cabelos ruivos,
olhos azuis,1,65 de altura e bem gordinha fala sobre a briga que se tinha
ouvido no prédio ao lado, dizendo que a mulher dona da voz não tinha respeito
pelas suas crianças. À sua esquerda, a vizinha de cabelos pretos, olhos
castanhos, um pouco baixa que a outra e também mais magra, só concordando com o
que era falado. No meio dessa confusão, Dona Gemma, uma descendente de
italianos de 85 anos, com cabelos pintados de cor caju, olhos azuis, 1,60 de
altura, era só sorrisos com toda aquela conversa.
Cheguei até ela como tínhamos combinado. A velha senhora interrompeu a conversa e abriu o portão e a porta da casa para que eu pudesse entrar. Chegando lá, reparei que a televisão ficava na sala principal, num móvel de mogno e embaixo ficava o piano, responsável pelo seu sustento. Mais adiante ficava uma mesa de vidro, onde nos sentamos para começar nosso bate-papo. Não demorou muito, Dona Gemma interrompeu a conversa porque estava tocando a campainha, levantou-se e foi abrir a porta para um antigo aluno que às vezes aparece para estudar no piano que fica na sala. Por este motivo, fomos para a cozinha, onde havia uma mesinha pequena de vidro ocupada com revistas e crochês que ela faz quando não está dando aulas.
Imigração
Italiana no Brasil
A imigração italiana no Brasil teve seu
auge no período entre 1880 e 1930. Segundo estimativa da
embaixada italiana no Brasil, vivem aqui cerca de 25 milhões de descendentes de
imigrantes italianos, espalhados principalmente pelos estados do Sul e do
Sudeste.
Os italianos começaram a migrar em número
significativo para o Brasil a partir da década de 1870. Foram impulsionados
pelas transformações socioeconômicas em curso no Norte da península itálica que
afetaram, sobretudo, a propriedade da terra. Um aspecto peculiar à imigração em
massa italiana é que ela começou a ocorrer pouco após a unificação da Itália
(1871), razão pela qual uma identidade nacional desses imigrantes se forjou, em
grande medida, em solo brasileiro.
As principais regiões de que os
italianos vieram são: Vêneto, Calábria, Lombardia e Toscana. Quando chegaram ao
Brasil, foram morar nas cidades de Minas Gerais, Santa Catarina, Rio de Janeiro
e São Paulo.
Em
São Paulo formaram os bairros da Vila Pompéia, Bixiga, Brás e Mooca, trazendo
uma variedades de coisas típicas italianas, principalmente as comidas, como espaguete
e pizza, além de suas canções e a sua religiosidade.
História da família de Dona Gema na Itália
A
família da Dona Gema veio na mesma época da onda imigratória dos italianos para
o Brasil, mas não como a maioria pois pagou sua passagem de primeira classe no
navio e seu intuito não era trabalhar na lavoura. O navio mais conhecido da época
era o navio “Giulio Cesare”, que transportava 5.638 passageiros e era dividido
entre 250 primeira classe, 306 na segunda classe e 1.800 na terceira classe. Como
a família da Gemma veio na primeira classe, desembarcou primeiro no porto de
Santos.
O
avô por parte de mãe, Amadeu Bonfante, nasceu na Lombardia e tinha como
profissão ser motonero de fabrica, chegando ao Brasil começou trabalhar nas
fabricas da Vila Mariana.
O seu
avó por parte de pai, Luigi Domenico Bertoldo, escritor de peças teatrais,
nasceu no Vêneto, nordeste da Itália, onde se localiza Veneza. Veneza é considerada
a cidade onde o amor acontece, diz a lenda que as pessoas que passeiam de gôndolas,
barcos venezianos, por seus rios nunca mais se esquecem. Além desta
peculiaridade, Veneza é conhecida pelo festival de cinema. Como ele era uma
pessoa de espírito aventureiro, viajou para a Inglaterra a fim de tentar a
sorte, mas não aguentou ficar naquele país. Sonhava em ir para os Estados
Unidos, mas como não conseguiu, resolveu comprar uma passagem para o Brasil, deixando
toda a família na Itália.
Luigi
encontrou um galpão grande e vazio e construiu uma fábrica com 40 teares de
tecido. Com o sucesso dessa empreitada, criou-se a loja Princesa dos Tecidos, que
ficava na Rua 25 de Março.
-A
loja ocupava sete portas, mas como meu avô e meu pai bebiam demais, acabaram indo
à falência.
Os
pais de Gemma, Luido Bertoldo e Emma Bonfante Bertoldo, se conheceram no Bairro
onde seus avós viveram, na Vila Mariana, e depois de dois anos se casaram.
Nascimento
de Gemma
A menina Gemma Bertoldo
nasceu na Vila Mariana no dia onze de junho 1924, numa época de bastante
dificuldade por conta da Revolução Constitucionalista de 24 em São Paulo.
Essa revolução
começou na década de 1920 e foi marcada
por inúmeros movimentos de contestação à política oligopolista praticada pelo
governo federal, fruto dos interesses políticos das classes dominadoras dos
estados de São Paulo e Minas Gerais. O revezamento na presidência da República,
ora de candidatos de um estado, ora de outro - com eleições fraudulentas -,
trouxe descontentamento aos demais estados brasileiros, e, principalmente, aos
militares. Despojados que haviam sido de certa influência na sociedade
brasileira pelo início da década de 1920, surgiu um movimento entre os jovens
oficiais - chamado de Tenentismo - que buscava o restabelecimento da
ética na condução dos destinos do Brasil. Foi um movimento que pregava a
abnegação do cidadão ao país, tanto que seu lema era: “À pátria tudo se deve,
nada se pede; nem mesmo compreensão”.
A revolução de 1924 foi liderada pelo general da reserva Isidoro Dias
Lopes, oficiais do Exército, incluindo alguns da Aviação Militar -
contando entre eles o Tenente Eduardo Gomes, que iniciou a revolta, em 5
de julho de 1924, tomando parte da cidade de São Paulo. Sob sua orientação, os
revoltosos foram os primeiros a empregar a aviação no conflito, requisitando
aeronaves entre aquelas existentes na cidade.
Em 1928 Gemma Bertoldo, com apenas cinco anos de idade, começou a
estudar piano.
- Todas as mocinhas estudavam este instrumento
musical por ser um sinal de educação naquela época.
Criada
como menina rica e mimada até os 12 anos de idade, sofreu uma grande transformação
quando o pai perdeu a Princesa dos Tecidos, por não conseguir administrá-la. Por
conta de mulheres e bebidas, perdeu todo o dinheiro, fazendo com que a família
saísse da Vila Mariana e fosse morar numa casa mais humilde no Brás, junto com
seus patrícios italianos.
Apesar
de todas essas dificuldades, Gemma continuou a estudar piano, porque gostava e
porque era chique. Mas por causa de sua depressão, motivada pela mudança do
padrão financeiro, teve que parar de estudar em 1936. Por conta disso, parou no
sexto ano do colégio, pulando para o sétimo. Quando voltou a estudar piano, sua
professora estava prestes a se casar e estava preparando três pessoas que já
estavam no sétimo ano para entrar no conservatório e sua professora falou que
ela tinha condição de entrar também.
Gemma entrou no Conservatório de Belém em 1937, para
continuar seus estudos com uma outra professora que percebendo seu talento
resolveu dar uma chance para a aluna. Em 1947, com apenas 23 anos de
idade, começou a dar aulas de piano para aquelas alunas que tinham mais
dificuldade de aprender. Depois que aquelas alunas eram ensinadas, voltavam
para a antiga professora e Gemma recebia em troca outras alunas inferiores. Cansada
de ser desrespeitada como profissional, Dona Gemma resolveu sair do
conservatório para começar a dar suas primeiras aulas particulares de piano.
Uma
das motivações que a fez começar a tocar piano foi o costume de assistir com o
pai a um programa de música clássica toda as manhãs de domingo, antes de ir
para missa. Sua primeira paixão em relação à música são as óperas, que tem como
principal característica o uso da voz apoiada por orquestra. Daqueles
musicistas clássicos, ela gosta de ouvir e de ensinar Beethoven e Chopin.
- O
primeiro era revolucionário, o segundo era romântico.
De
fato, Ludwig van Beethoven foi um compositor
alemão considerado um dos pilares da música ocidental, pelo incontestável
desenvolvimento, tanto da linguagem, como do conteúdo musical demonstrado nas
suas obras, permanecendo como um dos compositores mais respeitados e mais
influentes de todos os tempos. Uma característica bem inusitada de Beethoven é
sua surdez, que não o atrapalhou em suas principais composições, como a Nona Sinfonia e a ópera Fídelio.
Fryderyk
Franciszek Chopin, polonês, é considerado um dos maiores compositores para
piano. Suas principais obras são: Valsa
Minuto e Sonata, Marcha Fúnebre e os Noturnos. Os Noturnos tem origem
no século XVIII e eram executadas em eventos ao ar livre de noite, por isso
o nome. O grande expoente deste tipo de sinfonia foi Chopin que criou 21 tipos
de sinfonia .
Consolidação
da Dona Gemma como professora de piano
Quando ela começou trabalhar como professora particular de piano, percebeu
que não era como antigamente, quando se começava a estudar com 5 anos de idade.
Atualmente possui dez alunos, entre eles apenas uma menina de 7 anos, sendo os
demais adultos que buscam estudar piano até como hobby.
Na visão dela, um dos motivos que fizeram com que cada vez menos os pais
e jovens pensem em estudar música clássica, tem a ver com o que se fala sobre
esse estilo. Sendo ele considerado de elite, muito caro para estudar e assistir
a concertos, além de ser preciso usar smoking para assistir a esses
eventos. Por conta de todo esse conservadorismo, os jovens avessos a essas
“caretices” resolvem fugir da música clássica.
Gemma considera que a idéia de usar obrigatoriamente o Smoking para assistir concerto não transmite
a nova realidade da música clássica.
- Esses conceitos que se tem deste estilo musical são referentes ao
passado não sendo condizentes com a produção e consumo da música clássica.
Mas apesar desses problemas, o mais incrível é que cada vez menos a
elite consome este produto e, atualmente, os jovens das classes C,De E estão produzindo e consumindo música clássica. Para mostrar como o mundo
está mudado, a professora de piano conta que foi com a mãe a um concerto de
música clássica, quando uma menina rica impressionada com o que via não parava
de comentar, um jovem mais humilde disse para ela ficar em silêncio porque em
concerto não se fala, apenas se aprecia a música, ouvindo.
A maior paixão de Dona Gemma é dar aulas, por vários fatores.
Um deles é passar o maior conhecimento possível para as pessoas, outro é a
alegria que ela sente em conversar com os mais jovens com o objetivo de
conhecer seus pensamentos e seus medos de enfrentar a vida. Ela os ajuda e em
contrapartida esta é uma forma de não se sentir sozinha.
Para as pessoas que acham que ser um pianista é fácil, ela
diz que precisa muita disciplina, como pelo menos 8 horas de ensaio por dia.
Mesmo assim sobreviver nesta profissão é muito difícil por conta das
dificuldades financeiras e pela falta de oportunidade no Brasil. Quem realmente
sonha com isso deve seguir adiante, mas não pode pensar em parar de se
aperfeiçoar sempre.
- Como professora particular de piano, cobro R$100,00 por pessoa,
mas para quem não pode pagar, dou aulas de graça.
Dona Gemma acredita
que aqueles realmente interessados em apreender piano devem sempre ter uma
chance, para que o conhecimento e a cultura sejam transmitidas para o maior
número de pessoas possível.
Atualmente, a maioria
dos seus alunos são pessoas que não querem se profissionalizar, mas sim apreender
piano por hobby. Profissionais das mais diferentes áreas como, por exemplo, biólogos,
artistas plásticos, atrizes, físicos, profissionais de enfermagem e advogados
procuram as suas aulas.
Dona Gemma, com seus
85 anos nunca está parada, quando não está lecionando, está costurando, bordando,
tricotando, vendo televisão ou conversando na porta da sua casa com as
vizinhas.
Qual é a opinião das pessoas que conhecem a Gemma?
As pessoas são unânimes em dizer que ela
é uma pessoa sempre sorridente ,de bem com a vida, uma mulher que é um exemplo de vitalidade, por
ter essa idade e ainda trabalhar para se sustentar .
Sua vizinha Bernadete Brandão, diz que
com 83 anos ela também trabalha, mas na opinião dela, Gemma trabalha para não
se sentir solitária, por que nos momentos em que ela está com seus alunos, se
sente muito bem, por estar transmitindo seus conhecimentos. “O aluno que não
pode pagar também estuda com ela, característica que enobrece qualquer ser humano”.
O Aluno Alex Rosato afirma que a
professora de piano trata todos aqueles que vão estudar na casa dela com muito
carinho, respeito e compreensão. Por isso, muitos deles que param de estudar
acabam ligando ou indo na casa dela só para visitá-la.
História
de alunos de Dona Gemma
A
professora de piano afirma que recebeu a visita, na semana anterior à
entrevista, de uma aluna que era a caçula da família e estudou piano por último
e ainda esta apreendendo com 56 anos de idade e a sua irmã que também foi sua
aluna na infância ainda hoje a visita, tendo seus 68 anos.
Alex Rosato, artista plástico, veio
trazer seu afilhado para ter aula com Dona Gemma e acabou estudando piano como
hobby.
-
Meu pai é músico, por isso já tentei estudar vários tipos de instrumentos eas
nenhum deles me encantou, mas quando conheci Gemma e sua paixão pelo seu ofício,
resolvi estudar.
O artista plástico afirma que se identificou
muito com a professora por ela ter a idade de sua avó que lhe ensinava piano e
por sentir que poderia desabafar com ela
como se estivesse falando com alguém de sua família.
Ao término da entrevista Dona Gema convida
a todos para voltar na sexta-feira dia 11 de junho de 2010 para comemorar seu
aniversario de 86 anos.
Aniversário de Dona Gemma
No dia de seu aniversário, chego
novamente na rua Paris, no Bairro do Sumarézinho e encontro em sua porta uma
ex-vizinha chamada Maria Luiza que espera que a porta se abra para que possa felicitá-la.
Abre-se a porta e Gemma aparece com seu
sorriso habitual, e nos pede para entrar. Nos leva imediatamente para a cozinha
onde está nos esperando o aluno Alex.
Nós
começamos a conversar sobre o ufanismo das ruas por conta da nossa seleção e no
meio da conversa entregamos nossos presentes. Alex mostra um pacote de uma
conhecida doceria da cidade de São Paulo e diz que aniversário sem bolo não é
aniversário. Eu também não podia chegar de mãos vazias e depois dele entrego a
ela um perfume comprado por mim e sou seguido pela sua vizinha que a presenteia
com um cachecol feito por ela.
Gemma agradece os presentes, mas fala
que está muito feliz por todos estarem em seu aniversário e depois desse
discurso cantamos parabéns cortamos o bolo.
Chegando
ao final da tarde, nos despedimos e saímos, cada um para uma direção, mas todos
lembrando do sorriso de felicidade de Gemma por ter passado esta data tão
importante para ela cercada de pessoas sinceras e que não tinham a menor
obrigação de estarem ali. Mal sabe Dona Gemma que a alegria maior
Ola Bruno, boa tarde! Acredito que a sra. Gemma que vc entrevistou, foi minha professora de piano. Você tem noticias dela, por favor?
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