Bullying não é brincadeira. Bullying não é mimimi
A chacina de
Goiânia é um alerta político. Um adolescente de 14 anos, vítima frequente das
ofensas de sua turma, roubou a pistola dos pais policiais militares e matou
dois colegas e feriu outros quatro dentro do Colégio Goyases na. Era uma vingança pelas humilhações
suportadas em silêncio ao longo do ano letivo. Ele vinha sendo hostilizado de
fedorento e chegou a receber até um desodorante como inesperado, pungente e
irônico presente.
Não tem como
justificar o crime, nem perdoá-lo. Mas é o momento de refletir sobre o quanto
subestimamos a violência escolar. O
bullying hoje está muito mais agressivo do que duas décadas atrás, pois envolve
também perseguição e segregação digital. Os desaforos não terminam na escola,
seguem pelo dia adentro na web. O sinal do fim da aula não interrompe o
medo.
A tortura psicológica não encontra pausa, com troças infinitas
pelos contatos no WhatsApp. O estudante esculhambado não vê para onde fugir,
pois a sua página no Facebook também é invadida por comentários ofensivos e
insinuações violentas.
Quem diz que
bullying sempre existiu e que a preocupação com apelidos é uma frescura não
acompanha a trolagem nas redes sociais.
Bullying é saúde mental, é saúde pública. Ao cuidar dele,
preventivamente, em campanhas nas escolas, estaremos economizando lá adiante
com internações e medicação nos hospitais.
Bullying não é exagero, não é drama, não é piada inofensiva, não é
implicância natural.
Quantos adolescentes, sem saída para a angústia, em vez de revidar
os ataques, cometem suicídio? E nunca ficamos sabendo. São engolidos pela
solidão, levando consigo os segredos malditos e perversos da convivência.
O adolescente é
uma bomba-relógio porque sente a vida com o dobro de intensidade dos adultos.
Ele ama e odeia ao mesmo tempo, está permanentemente à flor da pele, caminhando
do tudo para o nada, do nada para o tudo. Alterna extremos de alegria e de
raiva em pouquíssimos minutos.
O corpo está
mudando, a voz está mudando, ele não reconhece mais a si e depende da aprovação
externa de seus amigos para assumir a identidade. Se não é aceito nos grupos
sociais, se não é aprovado, ele se convencerá de que é um monstro, entenderá
que crescer é uma metamorfose do mal.
Ele também não tem nenhuma reserva emocional: perdeu a proteção e
a segurança da infância. Não caminha mais de mãos dadas com os pais, não recebe
colo, não cura as discussões com abraços, não se desculpa com beijo.
Não acontecerá o contato da pele para reaver os vínculos. É
somente cobrado sem os prêmios do afeto e do conforto de quando era pequeno. No
fundo, encontra-se sozinho pela primeira vez no mundo. Pretende se mostrar
independente, porém é carente e sedento de reconhecimento.
O adolescente é órfão de suas perguntas e aflições. Tranca o
quarto e chaveia o coração.
Ele merece um
cuidado especial. Não se abrirá com facilidade. Não comunicará o seu
sofrimento. O costume é engolir o pedido de socorro. Talvez tente emplacar uma
conversa séria uma única vez, mas, se fracassar, não voltará a tocar no
assunto. Mergulhará de novo para a educação fingida e respostas
monossilábicas.
O adolescente
não dá segunda chance para a confissão. Ou os pais e educadores permanecem
atentos aos sinais ou ele irá explodir secretamente contra si ou contra todos.
A recuperação exige a confiança rarefeita do desabafo. Porque a
dor, quando guardada, aumenta. Já a dor, quando partilhada, diminui - quem
consegue falar descobre que a sua dor não é exclusiva e que muitos sofrem
parecido.
Bullying destrói personalidades fortes, desmancha temperamentos
firmes. Sua maior maldade é transformar a ferida em alegria, as privações em
palhaçadas. As risadas machucam. Apanha-se de risadas. Pessoas se divertem às
custas do constrangimento de alguém. De sinônimo do bem, a gargalhada é
convertida em veneno.
O que nos resta a fazer é mudar o nosso entendimento de coragem.
Coragem não é sofrer sozinho, é pedir ajuda.
Autor :Fabrício Carpinejar
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