segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Jogadora surda faz Palmeiras passar a usar sinais em vez de gritos


     Após chegada de Stefany Krebs, clube começa a usar
 Libras e gestos no dia a dia

                    


   A jogadora Stefany Krebs é surda. Isso não impediu
que chegasse à seleção brasileira de futsal e se tornasse campeã
 mundial no ano passado. Também não freou o interesse do
 Palmeiras, que decidiu contratá-la para a equipe profissional com
 jogadoras que ouvem normalmente.

Ela é a primeira surda do time alviverde. A surdez também não
 inviabiliza a comunicação com as companheiras, apenas transforma
 a troca de informações. Ela ensina a Língua Brasileira de Sinais
 (Libras) enquanto as amigas inventam gestos para as jogadas
e para o dia a dia. 

A equipe já combinou diversos sinais para o jogo, como pressão
 para roubar a bola, posicionamento e cuidado com o lançamento
nas costas.

A defensora Stella, uma das mais próximas de Stefany, explica
que o segredo é fazer gestos, como agitar os braços quando
 quiser receber a bola. Para chamar a atenção quando a
companheira está de costas, é preciso o contato corporal, como
um toque no ombro. “Ela já falou que a gente pode empurrá-la
 para a chamar a atenção”, sorri Stella. “Tem sido um aprendizado
muito legal para todo mundo”, revela. 

Stefany, que gosta de ser apenas “Tefy”, também usa
a leitura labial para entender o que os outros querem. Nesse caso,
o interlocutor tem de articular bem as palavras e falar devagar.
“Estamos conversando aos poucos. Elas falam ‘bom dia’ e eu me
 sinto feliz. Eu não estou sozinha. Estou sendo incluída”, diz a
 atleta com a ajuda de Eder Zanella, professor e intérprete de
Libras que acompanhou a entrevista exclusiva ao Estado. 

Obviamente, esse é um aprendizado lento. Apresentada na
semana passada como um dos reforços da temporada, a
 atleta de 21 anos ainda está se adaptando. “No começo, eu
 estava nervosa e agitada, mas depois as coisas foram acontecendo.

 A angústia acabou. É um passo depois do outro”, explica. “Às
vezes, o surdo tem medo de tentar. A gente tem voz. A gente
consegue”, diz a jogadora.

Para facilitar a inclusão no time do Palmeiras – essa é uma
 palavra importante e que vai aparecer outras vezes –, o clube
 contratou especialistas no tema. O preparador físico William
 Bitencourt e a analista de desempenho Vanessa Silva trabalham
 no clube e também fazem parte da comissão técnica da seleção
 brasileira de futsal de surdos. “

Estamos dando uma atenção maior a ela neste início. Antes
do treino, apresentamos um vídeo e explicamos como vai ser o
trabalho do dia. Depois, fazemos os ajustes. São pelo menos
 três sessões de treinos fora do campo com ela”, explica o
profissional. 

o Estado acompanhou parte
 dessa interação. No estádio Nelo Brancalente, em Vinhedo,

cidade do interior que se tornou a sede do futebol feminino
 do Palmeiras, William se posiciona perto da linha lateral e orienta
 Tefy com frequência durante o treino coletivo. Sempre em Libras.
Na hora das orientações do treinador Ricardo Belli, a mesma coisa. 

Natural de Erechim (RS), Stefany tem dois irmãos: Jean, surdo,
 e Josiane, ouvinte. O problema foi detectado quando ela tinha
dois meses. “Esse diagnóstico foi realizado precocemente porque
 já tínhamos vivenciado todo esse processo com o meu outro filho.

Quando descobrimos a surdez do Jean (com pouco mais de 1 ano)
tudo foi muito difícil, por ser algo novo, tivemos todo o processo de
 luto da família, de tentar entender o porquê aquilo estava
 acontecendo e como iríamos lidar”, explica Roseli Marcia Benati,
mãe de Stefany e intérprete de Libras na prefeitura de Erechim (RS). 

“Nós passamos a reconhecer a potencialidade e capacidade dos
 surdos e passamos a lutar por escolas para surdos”, explica.
“Meus filhos me constituíram como pessoa e como mãe.
Tenho muito orgulho deles”, completa. 

A adaptação de Tefy é facilitada pela percepção visual dos
surdos, muito mais apurada do que a das jogadoras ouvintes.
 “Quem ouve, espera as orientações do treinador. Ela tem de ser
 independente, olhar a bola, o rival, a arbitragem, o treinador e o
time”, conta William. 

Carismática e extrovertida, a menina capta detalhes da postura,
 do jeito e até da personalidade das companheiras e faz imitações
 na concentração em Vinhedo. “Todo mundo morre de rir com as
 imitações. Ela capta detalhes que a gente não percebe”, diz o
preparador físico.

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