Após chegada de Stefany Krebs, clube começa a usar
Libras e gestos no dia a dia
A jogadora Stefany Krebs é surda. Isso não impediu
que chegasse à seleção brasileira de futsal e se tornasse campeã
mundial no ano passado. Também não freou o interesse do
Palmeiras, que decidiu contratá-la para a equipe profissional com
jogadoras que ouvem normalmente.
Ela é a primeira surda do time alviverde. A surdez também não
inviabiliza a comunicação com as companheiras, apenas transforma
a troca de informações. Ela ensina a Língua Brasileira de Sinais
(Libras) enquanto as amigas inventam gestos para as jogadas
e para o dia a dia.
A equipe já combinou diversos sinais para o jogo, como pressão
para roubar a bola, posicionamento e cuidado com o lançamento
nas costas.
A defensora Stella, uma das mais próximas de Stefany, explica
que o segredo é fazer gestos, como agitar os braços quando
quiser receber a bola. Para chamar a atenção quando a
companheira está de costas, é preciso o contato corporal, como
um toque no ombro. “Ela já falou que a gente pode empurrá-la
para a chamar a atenção”, sorri Stella. “Tem sido um aprendizado
muito legal para todo mundo”, revela.
Stefany, que gosta de ser apenas “Tefy”, também usa
a leitura labial para entender o que os outros querem. Nesse caso,
o interlocutor tem de articular bem as palavras e falar devagar.
“Estamos conversando aos poucos. Elas falam ‘bom dia’ e eu me
sinto feliz. Eu não estou sozinha. Estou sendo incluída”, diz a
atleta com a ajuda de Eder Zanella, professor e intérprete de
Libras que acompanhou a entrevista exclusiva ao Estado.
Obviamente, esse é um aprendizado lento. Apresentada na
semana passada como um dos reforços da temporada, a
atleta de 21 anos ainda está se adaptando. “No começo, eu
estava nervosa e agitada, mas depois as coisas foram acontecendo.
A angústia acabou. É um passo depois do outro”, explica. “Às
vezes, o surdo tem medo de tentar. A gente tem voz. A gente
consegue”, diz a jogadora.
Para facilitar a inclusão no time do Palmeiras – essa é uma
palavra importante e que vai aparecer outras vezes –, o clube
contratou especialistas no tema. O preparador físico William
Bitencourt e a analista de desempenho Vanessa Silva trabalham
no clube e também fazem parte da comissão técnica da seleção
brasileira de futsal de surdos. “
Estamos dando uma atenção maior a ela neste início. Antes
do treino, apresentamos um vídeo e explicamos como vai ser o
trabalho do dia. Depois, fazemos os ajustes. São pelo menos
três sessões de treinos fora do campo com ela”, explica o
profissional.
o Estado acompanhou parte
dessa interação. No estádio Nelo Brancalente, em Vinhedo,
cidade do interior que se tornou a sede do futebol feminino
do Palmeiras, William se posiciona perto da linha lateral e orienta
Tefy com frequência durante o treino coletivo. Sempre em Libras.
Na hora das orientações do treinador Ricardo Belli, a mesma coisa.
Natural de Erechim (RS), Stefany tem dois irmãos: Jean, surdo,
e Josiane, ouvinte. O problema foi detectado quando ela tinha
dois meses. “Esse diagnóstico foi realizado precocemente porque
já tínhamos vivenciado todo esse processo com o meu outro filho.
Quando descobrimos a surdez do Jean (com pouco mais de 1 ano)
tudo foi muito difícil, por ser algo novo, tivemos todo o processo de
luto da família, de tentar entender o porquê aquilo estava
acontecendo e como iríamos lidar”, explica Roseli Marcia Benati,
mãe de Stefany e intérprete de Libras na prefeitura de Erechim (RS).
“Nós passamos a reconhecer a potencialidade e capacidade dos
surdos e passamos a lutar por escolas para surdos”, explica.
“Meus filhos me constituíram como pessoa e como mãe.
Tenho muito orgulho deles”, completa.
A adaptação de Tefy é facilitada pela percepção visual dos
surdos, muito mais apurada do que a das jogadoras ouvintes.
“Quem ouve, espera as orientações do treinador. Ela tem de ser
independente, olhar a bola, o rival, a arbitragem, o treinador e o
time”, conta William.
Carismática e extrovertida, a menina capta detalhes da postura,
do jeito e até da personalidade das companheiras e faz imitações
na concentração em Vinhedo. “Todo mundo morre de rir com as
imitações. Ela capta detalhes que a gente não percebe”, diz o
preparador físico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário