O crime brutal foi filmado, mostrando a
travesti sentada ensanguentada no chão, recebendo pauladas e chutes desferidos,
entre xingamentos, por pelo menos quatro homens. O vídeo viralizou, com dezenas
de milhares de compartilhamentos no YouTube.
Em 2016,
144 travestis e transexuais foram assassinadas no país, segundo Grupo Gay da
Bahia. Neste ano, ate março , já foram 23 e o numero tende a aumentar .
Segundo vizinhos e pessoas que a conheciam,
Dandara distribuía sorrisos por onde passava e ganhava a vida vendendo roupas
usadas, além de ajudar a mãe nas atividades domésticas.
Acordava
logo cedinho, às 5h já estava de pé e às 6h o café já estava na mesa. Meu filho era querido por onde passava.
Todo mundo aqui na rua brincava com ele, os garis, as meninas da padaria, todo
mundo", conta a mãe, Francisca Ferreira de Vasconcelos, de 74 anos.
Embora a
Polícia Militar do Ceará já tenha prendido sete envolvidos no crime, a atuação
da PM-CE foi criticada pela demora em agir. As prisões só foram feitas dois
dias após a divulgação do vídeo e 18 dias após a morte de Dandara.
A família chora não só pela perda do ente
querido, mas também por Dandara ter sido vítima de intolerância.
"Meu filho (Dandara) não tinha inimigos,
ele foi morto por preconceito. Por ser travesti, ele vivia sendo humilhado.
Agora eu pergunto, qual o problema de ser assim, me diga?", indaga a
mãe.
Para ONGs que trabalham com a população LGBT,
muitos casos de assassinatos de travestis ou transexuais motivadas por ódio e
preconceito permanecem impunes.
Segundo o Grupo Gay da Bahia, eles formam o
segundo grupo mais atingido entre vítimas fatais de ataques homofóbicos em
2016. Dos 343 assassinatos de pessoas LGBT, 173 eram gays (50%), 144 (42%)
trans (travestis e transexuais), 10 lésbicas (3%), 4 bissexuais (1%), além de
12 heterossexuais também em crimes homofóbicos - eram amantes de transexuais,
chamados "T-lovers".
Números em falta
É impossível saber quantos transexuais e
travestis foram mortos no país, em busca feita nos dados das secretarias de
segurança pública. Os Boletins de Ocorrência não geram indicadores baseados em
identidade de gênero e orientação sexual.
O nome de
Dandara, por exemplo, consta no relatório diário de Crimes Violentos Letais
Intencionais (CVLI) da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado
do Ceará (SSPDS) como Antônio Cleilson Ferreira Vasconcelos, seu nome de
registro de nascimento. No espaço destinado ao tipo de arma utilizada no crime,
está escrito apenas "outros
Para o
Grupo de Resistência Asa Branca (Grab), com sede em Fortaleza, a falta de
estatísticas oficiais seria uma prova da ausência do governo na luta contra a
homofobia.
"Se não existem dados, é porque não
existimos para eles, somos ignorados. No entanto, existe uma série de
assassinatos, ataques coletivos a travestis, transexuais, gays e lésbicas, que
culminam em crimes cruéis, que em sua maioria tem características que
demonstram um percurso de tortura, até a execução", afirma Dário Bezerra,
representante do grupo.
Irmão diz que além do
preconceito, morosidade da polícia levou à morte de Dandara
Para o
professor e pesquisador do Núcleo de Políticas de Gênero e Sexualidade (NPGS)
da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
(Unilab), Carlos Eduardo Bezerra, a ausência da discussão sobre gênero e
direitos humanos contribui para esse tipo de violência.
"Nada justifica estes crimes. Mas a
ausência de políticas públicas efetivas (educação, saúde, emprego, lazer)
voltadas para garantir a dignidade e a proteção de pessoas LGBT, sobretudo
aquelas mais vulneráveis; a ausência da discussão sobre direitos humanos,
gênero e identidade de gênero em escolas e espaços de formação; o avanço do
discurso fundamentalista, contribuem para estes tipos de crimes", analisa
o pesquisador.
Omissão
O irmão de Dandara, Ricardo Vasconcelos, de
39 anos, aponta não só o preconceito e a intolerância como causa da morte de
Dandara, mas também a morosidade da polícia em intervir na ação dos
assassinos.
Ele conta que ligações foram feitas ao número
de emergência 190 durante o espancamento de sua irmã, mas a PM-CE só chegou ao
local após o óbito.
"Vamos entrar com uma ação contra o
Estado, eles foram omissos, e essa omissão matou meu irmão. A gente tem provas,
o pessoal do bairro onde ele morreu falou que ligou pro 190 e a polícia só
chegou na hora de isolar o corpo, e acho que é porque disseram que iam
queimá-lo se a PM não chegasse", diz Ricardo.
O
Secretário de Segurança Pública do Ceará, André Costa, disse que a viatura que
estava mais próxima do local não foi encaminhada por estar atendendo a uma
ocorrência. Mas, após uma segunda ligação, outra viatura foi direcionada ao
local.
"Na
realidade, o que temos é que a demanda é grande para as viaturas que estão nas
ruas. Mas nós estamos trabalhando para colocar mais viaturas nas ruas",
explicou Costa.
Questionada
sobre uma possível omissão da PM-CE em relação ao massacre de Dandara, a
Defensoria Pública Geral do Estado (DPGE), por meio do Núcleo de Direitos
Humanos, informou que, até o momento, nenhuma denúncia chegou à defensoria.
Mas, caso tenha ocorrido alguma omissão, ela será investigada pela DPGE.
O
Ministério Público do Estado (MP-CE) disse esperar que os culpados sejam
prontamente processados e que respondam por suas ações.
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