Na zona oeste do Rio, os problemas começaram
para Laura, de 13 anos. "Ela é popular. Faz amizade fácil e é bonita
Aquilo provocou a ira de um grupo de
colegas", lembra Rita, de 46 anos, mãe da jovem. Para conter as brigas na
escola particular, a menina foi trocada de turno, mas a família jamais
imaginaria que, mesmo distante dos antigos colegas, as agressões continuariam
em outro espaço: o virtual
"Achei que haveria um basta. Mas foi
pior. Pegaram a foto dela e botaram nas redes sociais. Fizeram o horror",
conta a mãe. "Se ela abria o live [vídeo ao vivo na internet], sempre
entrava um e xingava." Laura foi ofendida com palavras como
"rata" e "demônio" nas redes sociais.
A situação ficou insustentável até que a mãe
trocou a menina de escola no meio do ano. "A foto da minha filha deve andar
na internet. Agora, ela está com trauma, no psicólogo. Amava publicar nas redes
e não posta mais." Os nomes de vítimas e familiares foram trocados na
reportagem para preservá-los.
Casos
como o de Laura não são isolados. Pesquisa do CGI.br (Comitê Gestor
da Internet no Brasil), de outubro, mediu o comportamento online de jovens. Os
dados revelam que, de cada quatro crianças e adolescentes, um foi tratado de
forma ofensiva na internet, o que corresponde a 5,6 milhões de meninos e
meninas entre 9 e 17 anos. O porcentual cresce ano a ano: passou de 15% em 2014
para 20% em 2015 até chegar a 23% no ano passado.
"Nesse
dado [sobre ofensas online], a criança ou adolescente foi exposto a um risco,
mas não necessariamente teve alguma sequela", pondera Maria Eugenia Sozio,
coordenadora da pesquisa TIC Kids Online Brasil.
A taxa,
portanto, nem sempre corresponde a cyberbullying – quando a agressão virtual é
repetida -, mas faz soar o alerta para perigos que crianças e adolescentes
correm na web e a importância da atenção dos pais.
Efeitos.
Segundo especialistas, as ofensas na internet podem ter impacto ainda maior na
vida das crianças. "Uma postagem atinge número incontável de pessoas e
isso aumenta o sofrimento da vítima. Ela não sabe quem viu ou não", afirma
a psicóloga e pesquisadora da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Luciana
Lapa.
Em casos de agressão na escola, o jovem
encontra refúgio em casa "No cyberbullying, não. Onde quer que ele vá, a
agressão vai junto", diz Luciana. Outro problema é a gravidade das
ofensas, encorajadas pela distância física da vítima. Também é comum que as
agressões partam de pessoas da mesma faixa etária e que fazem parte do
convívio.
Para a
pedagoga e psicopedagoga clínica e institucional Denise Aragão, as ofensas
podem afetar até o desempenho na escola. "As
crianças ficam preocupadas em se defender e perdem o desejo de aprender."
O uso crescente dos smartphones pelos jovens, com acesso cada vez mais
particular, desafia a mediação dos pais.
A gerente
de operações Ana, de 53 anos, conhecia os riscos da internet, mas se assustou
quando passou por uma situação constrangedora na família. Quando a filha tinha
14 anos (hoje ela tem 18), uma foto íntima da garota vazou entre alunos de uma
escola particular na zona sul paulistana após uma brincadeira entre amigas. Os
celulares facilitaram a propagação.
"Ela
ficou envergonhada. Foi uma semana de constrangimentos", conta. "Em
casa, fizemos questão de explicar o quão sério aquilo era. Mostramos que isso
pode ficar no currículo dela para o resto da vida."
Mediação
A mãe de Helena, de 10 anos, só percebeu o
problema depois que notou que a filha estava cabisbaixa e chorava pelos cantos.
"Fizeram um grupo no WhatsApp (entre os colegas da escola) para xingá-la
por causa da cor. Chamavam de macaca e ‘nega’ do cabelo duro", conta a
assistente administrativa Adriana, de 39 anos.
Ela procurou os pais dos agressores.
"Fazia uma semana que um deles tinha dado um celular para uma das meninas.
Foi aí que ele descobriu. Acho que os pais deveriam prestar mais atenção ao que
o filho faz na internet", desabafa.
Apesar de
23% das crianças e adolescentes terem relatado à pesquisa que foram vítimas de
ofensas na internet, só 11% dos pais disseram que os filhos passaram por
incômodos.
A falta de intimidade de adultos com a
tecnologia – enquanto as crianças são nativas digitais – ajuda a explicar a
dificuldade das famílias em identificar riscos. "O gap existe, mas é
preciso revertê-lo. Uma sugestão é estar disponível, querer saber o que a
criança faz na internet", diz Heloisa Ribeiro, da Childhood Brasil,
entidade de proteção a crianças e adolescentes.
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